A história da humanidade está profundamente entrelaçada com a história da economia, das finanças e, mais especificamente, da concessão de crédito. De fato, o problema do crédito antecede o mercado de crédito, na sua acepção moderna. Ele provavelmente antecede até mesmo a criação do dinheiro!
O crédito já era um dilema desde as formas mais antigas de organização social. Como exemplo, imagine uma pessoa que pegasse sementes emprestadas para trocar pela produção, após a colheita.
É claro que, naquela época, tudo era informal. Não havia um mercado de crédito, não havia regulação ou fiscalização. Retomando nosso exemplo: e se o homem pegasse as sementes e depois se recusasse a entregar a parte da colheita como prometeu? O risco, para os credores, era muito alto.
Com a evolução das sociedades, da economia e do mercado de crédito, a situação foi mudando. Hoje, existem dois fatores muito importantes que ajudam a controlar o risco para os credores. O primeiro é o estabelecimento de garantias. O segundo – e, possivelmente, mais importante – é a avaliação de crédito do tomador.
A relação entre credores e tomadores de crédito é afetada diretamente pelo risco de crédito. Altos níveis de risco de crédito são prejudiciais para as duas partes.
O credor pode ter uma promessa de retorno maior para compensar o risco elevado. Porém, dada a incerteza do recebimento, a relação torna-se especulativa. Boa parte dos credores recusa crédito para tomadores de alto risco porque um retorno certo, ainda que menor, é mais atrativo.
No Brasil, o conservadorismo do mercado de crédito tende a ser ainda maior, pois o cenário macroeconômico já é muito instável. Ou seja, mesmo tomadores que apresentam um perfil de baixo risco podem se tornar inadimplentes de uma hora para outra. Isso acontece devido à volatilidade de circunstâncias como taxa de juros, inflação, PIB, desemprego e outras.
É por isso que conhecer o tomador de crédito é tão importante. Quanto mais informações houver sobre essa pessoa – física ou jurídica –, mais precisa será a avaliação do seu perfil. Assim, os credores podem evitar tomadores de alto risco.
Conhecer melhor o tomador possibilita, também, aplicar de forma mais coerente e justa as condições de crédito para cada perfil. Vale a pena lembrar que, além de taxas de juros mais baixas, os tomadores com perfil de baixo risco também costumam ter acesso a prazos mais alongados e oportunidades de rolagem de dívida.
Naturalmente, a avaliação do perfil não é subjetiva. Do contrário, ela não seria confiável. Em vez disso, as informações sobre o tomador são aplicadas a modelos estatísticos complexos.
Esses modelos permitem correlacionar certos conjuntos de características com a probabilidade de inadimplência. Assim, o mesmo conjunto de características deve, teoricamente, levar sempre ao mesmo resultado. Em outras palavras, o resultado é independente do analista.
Os conjuntos são compostos por dezenas ou centenas de variáveis, que afetam o resultado em pesos distintos. O peso que cada instituição atribui a uma certa variável reflete sua visão sobre o impacto que ela exerce, individualmente, sobre o perfil de risco do tomador.
Os modelos estatísticos do mercado de crédito já são aplicados há mais de 30 anos. Eles foram aperfeiçoados ao longo do tempo, até atingir extrema precisão. Hoje, com a quantidade exponencial de dados e a capacidade analítica, a partir de técnicas de Machine Learning cada vez mais avançadas, os modelos se tornaram mais confiáveis (acertam mais, ajudam a separar melhor o público “bom” do “mau”), além da possibilidade de automatizar a decisão de crédito de forma rápida e online.
Todos esses avanços tornaram a relação risco-retorno mais atrativa na operação de qualquer mercado, seja o de crédito, ou de cobrança, de prevenção à fraude, CRM etc.
As necessidades do mercado financeiro são um grande impulso para o desenvolvimento tecnológico. Um exemplo recente é o avanço do blockchain para abrir portas a um novo mercado financeiro, marcado pela descentralização.
Nesse sentido, o mercado de crédito desempenha um papel importante para incentivar a inovação em tecnologia. Mais especificamente, ele incentiva o surgimento de tecnologias mais eficazes e eficientes para conhecer e avaliar os tomadores.
Isso nos leva diretamente ao campo do Machine Learning, ou aprendizado de máquina.
Agora, você pode estar se perguntando por que os avanços tecnológicos são tão relevantes, se o mercado de crédito já está maduro há uns anos e conta com modelos estatísticos eficientes. A resposta está em dois aspectos práticos: capacidade e velocidade.
Conforme esse mercado se expande, o volume de dados aumenta. Consequentemente, torna-se inviável aplicar soluções manuais e processos obsoletos para resolver seus problemas.
O Machine Learning utiliza um conjunto de técnicas avançadas de aprendizado de máquina que, em conjunto com dados com alto valor preditivo, permitem entregar uma resposta mais assertiva, além de permitir automatizar e acelerar o deployment destes modelos.
A diferença hoje está na capacidade computacional em processar diversos conjuntos de dados e aplicar técnicas matemáticas e estatísticas avançadas nesse conjunto.
Outro aspecto importante é a velocidade que estes modelos são treinados e “colocados em produção”. Neste contexto, a alta demanda dos tomadores e a disponibilidade cada vez maior de informações exigem que os modelos sejam atualizados mais rapidamente e com maior assertividade.
Para entender melhor a importância do Machine Learning para o mercado de crédito, é preciso levar em consideração dois fatores: a disponibilidade de informações e a demanda de tomadores.
Com o surgimento e a disseminação da internet, temos acesso a mais informações do que nunca. Isso inclui informações relevantes para a avaliação do perfil dos tomadores.
Ignorar essas informações seria abrir mão da chance de fazer avaliações ainda mais assertivas – e, portanto, obter resultados ainda melhores nas operações de crédito. Treinar um modelo a partir de mais variáveis e, principalmente, combinar variáveis que possuam valor para o negócio é essencial para aumentar a assertividade de um modelo de concessão de crédito.
Dessa maneira, torna-se imprescindível construir um processo para a coleta e o tratamento de dados, seguidos de um processo único de construção de variáveis com alto poder preditivo: os catálogos de variáveis.
Construir catálogos de variáveis, utilizando as ferramentas corretas disponíveis no mercado, pode reduzir em até 70% o esforço de um processo de Engenharia de Dados e trazer resultados poderosos para os modelos de crédito. Esse é um caminho rápido, na minha opinião, para promover mais eficácia na tomada de decisões e resultados melhores nas operações de crédito.
A demanda de tomadores está crescendo. Essa é uma tendência que atinge vários segmentos. Ela é uma excelente notícia para todas as instituições que atuam no mercado de crédito.
Um bom exemplo é o segmento de crédito para pequenos negócios: em 2020, a demanda dobrou. Nos últimos seis meses do ano, 38% dos pequenos negócios buscaram empréstimos bancários.
Outro exemplo é o segmento de crédito ao consumidor. Ele atingiu um recorde de demanda no 1° semestre de 2021. Houve um crescimento superior a 26% em relação ao mesmo período de 2020.
Conforme a demanda por crédito aumenta, ter um modelo mais assertivo torna-se uma vantagem competitiva para os negócios, à medida que é possível praticar taxas e condições mais favoráveis, garantindo mais democratização no mercado financeiro.
E isso só é possível quando combinamos:
O mercado de crédito já superou, há muito tempo, a fase do trabalho “artesanal”, manual. Ele se posiciona na vanguarda da tecnologia para otimizar a tomada de decisões e, consequentemente, os resultados. Considerando as possibilidades que o Machine Learning e as tecnologias certas oferece, atualmente para o ganho de eficácia e eficiência, esse é o novo diferencial competitivo do setor.
Porém, justamente devido ao caráter vanguardista do mercado de crédito, não há tempo a perder. As instituições financeiras que não se organizarem rapidamente para adotar Machine Learning correm o risco de perder a janela de ganho de competitividade. Elas vão ser ultrapassadas por concorrentes mais focados em inovação – uma distância muito difícil de recuperar.